De que forma uma cidade pode escoar os efluentes de esgoto produzidos todos os dias? Esta é uma problemática discutida em todo o mundo. Uma solução antiga parece ser considerada uma boa opção, mas ao mesmo tempo provoca polêmica quanto aos possíveis impactos ambientais. Pois bem, o emissário submarino é o exemplo de tecnologia usado para atender essa necessidade, lançando os efluentes condicionados ao mar, através de uma tubulação, visando aproveitar a capacidade de depuração do oceano.

Mas então, o esgoto precisa ser tratado antes de ser lançado ao mar?

Existe uma controvérsia quanto ao lançamento do esgoto no mar sem tratamento. Em 2005, a Resolução 375 do Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA proibiu o lançamento do esgoto no mar sem o devido tratamento prévio. No Rio de Janeiro, é exigido o tratamento primário antecedendo o lançamento através do emissário, como afirma o professor e especialista em saneamento básico, Ernani Costa.

No Brasil e em outros países, existem milhares de emissários submarinos. O primeiro a ser construído aqui, está localizado em Ipanema, uma das mais famosas praias do Rio de Janeiro, desde 1975 e permanece em funcionamento até hoje, com tratamento preliminar somente (gradeamento).

Confira a seguir a 2ª parte da entrevista exclusiva com o Presidente da Conen Infraestrutura Urbana, o Engenheiro Civil e Professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC, Ernani de Souza Costa.


1 – Especificamente sobre o emissário submarino de Ipanema, muito se discutiu sobre seus impactos se poluía as praias da zona sul ou não. Ainda existe essa preocupação? O esgoto que é despejado lá é tratado?

Em uma determinada época, existiu a intenção de construção de uma estação de tratamento antecedendo o lançamento no submarino. Quando o emissário foi construído não havia uma legislação obrigatória, mas foi considerado que seriam retirados todos os sólidos e todas as gorduras com o auxílio de peneiras com 0,2mm de espaçamento. A estação de tratamento deveria ser feita em um local que hoje é ocupado pela comunidade Pavão-Pavãozinho, então foi feito o projeto, mas durante as sondagens executadas na rocha, acharam falhas que obrigariam a fazer uma estrutura de contenção interna (dentro da rocha) de valor extremamente alto e que na época não era previsto. Sendo assim, foram em busca de outras alternativas para a implantação da estação de tratamento – uma opção seria na Francisco Sá; em terreno da CEDAE onde hoje existe a Estação Elevatória André de Azevedo, outra seria em um terreno que à época era livre, mas que pertencia ao exército brasileiro onde hoje se localiza o Parque Garota de Ipanema, mas devido às divergências, a estação não foi executada naquele período, nem nunca foi feita. Como a autorização do emissário foi calculada como se não existisse a estação de tratamento, o emissário submarino de Ipanema até hoje não possui nenhum tipo de tratamento prévio que não seja o gradeamento grosseiro.

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Fonte: Jornal O Globo

2 – Seria ideal que houvesse um tratamento antes?

Na época o órgão ambiental que era a FEEMA precursora do INEA de hoje, estipulou um monitoramento muito intenso. Este monitoramento contava com 16 estações de coleta com 3 níveis de profundidade, e cada uma dessas 16 com frequências variando em todas elas. Este trabalho realizado pelo biólogo Evandro Rodrigues de Brito foi feito ao longo de aproximadamente 3 anos ou um pouco mais, se não me engano. A riqueza de detalhes foi tão grande, que este trabalho foi apresentado em um Congresso Internacional – na Argentina e recebeu premiação. Como consequência, o monitoramento foi suspenso porque ficou definitivamente comprovado que não afetava em nenhum item as campanhas de praia. Foi verificado que a influência se fazia no canal da Visconde de Albuquerque e não pelo emissário submarino. Após esta confirmação, foi implantada uma comporta de tempo seco no canal da Visconde de Albuquerque, justamente por causa deste esgoto difuso que chegava ao mar. Em resumo, poderia ser realizado um tratamento preliminar apenas para retirada de matérias sólidas, gorduras, cabelos, guimba de cigarros, absorventes que ainda são lançados no esgoto pela população e que o gradeamento grosseiro existente não resolve totalmente.

3 – Quanto aos emissários existentes no Brasil. O que é possível avaliar?

Existe uma falta de dados muito grande, mas não há nenhum emissário que cause problema de contaminação nas suas zonas de balneabilidade. Veja que temos emissários que são complicados, como o emissário de Santos que só possui 13 metros de profundidade, ou seja, sua mancha de difusão alcança a superfície, o que não acontece com os outros emissários brasileiros, mas mesmo assim não há sua contribuição efetiva na zona de balneabilidade.

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Fonte: Google Earth

4 – Para finalizar, o senhor já participou de algum projeto de elaboração de Emissário Submarino?

Participei da elaboração do emissário de Ilha de Paquetá, Icaraí, da Barra da Tijuca, de Rio das Ostras, de Verolme (Angra dos Reis), de Natal, de Fortaleza, de Manaus, de Assunção (Paraguai), de Limon (Costa Rica), de Quepos (Costa Rica) e de Puerto Cortés (Honduras). Na América Central, o estudo e os cálculos são feitos observando as variações do fundo marinho pelo fato de estarem em regiões que apresentam atividades vulcânicas.

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Emissário Submarino da Barra da Tijuca (em construção)

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Emissário Submarino de Rio das Ostras (em construção)